À época do Romantismo
literário, vê-se um mundo e pessoas divididos entre o bem e o mal, em que
relativizar esses dois conceitos era bastante difícil. Com a evolução da
sociedade e à luz da Modernidade, observa-se um mundo composto por esta
dicotomia dividida por linha muito tênue.
Na versão cinematográfica, Malévola (2014), expressa-se ideologia mais convergente à contemporaneidade nas suas complexas relações sociais. Embora se tenha no conto Sol, Lua e Tália essa visão mais contemporânea, não se pode afirmar que a versão A Bela Adormecida retrate de maneira moderna a relação bem versus mal. Nessa, a visão maniqueísta está bem demarcada, como veremos a seguir.
Na versão cinematográfica, Malévola (2014), expressa-se ideologia mais convergente à contemporaneidade nas suas complexas relações sociais. Embora se tenha no conto Sol, Lua e Tália essa visão mais contemporânea, não se pode afirmar que a versão A Bela Adormecida retrate de maneira moderna a relação bem versus mal. Nessa, a visão maniqueísta está bem demarcada, como veremos a seguir.
Sol,
Lua e Tália ou A Bela Adormecida
Presente no imaginário de
grande parte do mundo ocidental, os contos de fadas permeiam o desenvolver das
gerações, estabelecem parâmetros, ditam conceitos, transpassando séculos e
séculos.
As versões feitas pelos irmãos Jacob e Wilhelm Grimm foram as que conquistaram maior
alcance entre as histórias “para crianças” nos últimos séculos. Histórias
muitas vezes adaptadas de versões orais que, em sua essência original, eram
destinadas a adultos.
E com A Bela Adormecida, podemos
notar um grande contraste entre a versão apresentada pelos irmãos Grimm (1812),
e aquela mais próxima das versões orais, aqui representada como Sol, Lua e Tália ,
publicada em Il Pantamerone
ossia La fiabe delle fiabe de Giambattista Basile (1636), e a partir
deste contraste podemos observar a transformação de uma história voltada ao
entretenimento adulto, a uma a ser apresentada posteriormente como um clássico
infantil, envolta em uma estética romântica e infantilizada.
Olhando
brevemente para o conto dos irmãos Grimm, temos uma história em que as coisas
acontecem simplesmente por acontecer. Uma rainha e um rei desejavam muito ter
filhos, mas não conseguiam. Então, nada mais natural do que um caranguejo na
banheira da rainha dizer a ela que seu desejo será realizado.
Logo
após o nascimento da criança, as fadas do reino são convidadas para
presentearem a linda princesa, a fada que não foi convidada, enfureceu-se, e
como castigo, destinou a princesa, que, quando jovem, espete o dedo em uma roca
e caia morta em seguida.
A última fada “boa”, que ainda não tinha dado seu presente,
amenizou a maldição: Mas não será uma morte de fato, ela apenas cairá em sono
profundo e permanecerá por cem anos. Quando a jovem cai em sono profundo é despertada por um beijo
do príncipe, e juntos vivem, felizes para sempre.
Agora, quando se tem em mãos o
conto de Basile, Sol, Lua e Tália, nos ocorre certo
estranhamento. Basile registra uma narrativa que parece pouco preocupada com os
valores cristãos da época, e menos ainda com algum interesse romântico. Dos que
recontaram essa história, sem dúvidas o autor italiano foi o que mais permitiu
elementos cruéis e contrários à moral em sua obra, e por tal motivo, pode ser
considerado o texto mais próximo das versões orais.
"[...] os
camponeses não precisavam de um código secreto para falar sobre tabus. [...] E
por aí vai, do estupro e da sodomia ao incesto e ao canibalismo. Longe de
ocultar sua mensagem com símbolos, os contadores de história [...] retratavam
um mundo de brutalidade nua e crua". (Darton, 1986)
Sol, Lua e Tália causa estranhamento no leitor logo nas primeiras
linhas: Tália, a protagonista, fura o dedo na farpa de linho e adormece já no
segundo parágrafo. O leitor contemporâneo fica desorientado por não saber o que
virá a seguir. Note-se que aqui não há feitiços de uma “fada má”, mas sim oque
ocorre é uma previsão de sábios e adivinhos sobre a sorte da jovem. Aliás,
sorte e destino são fatores muito utilizados no conto.
A seguir, vem uma das cenas mais impactantes do conto de Basile.
Um rei, que caçava pelo bosque, depara-se com o palácio e chama por alguém,
como ninguém o atendia, resolve entrar. Encontrando a bela moça que lhe parecia
encantada, chamou-a, porém como esta não respondia, levou-a a um leito onde colheu
dela os frutos do amor. Ou seja, estuprou-a, pois Tália
adormecida não consentiu o ato. A seguir, o rei a deixa.
Temos aqui um segundo caso de
abandono. Se pensarmos nos valores cristãos amplamente conhecidos, a atitude do
rei não é nobre (como se espera de um cristão, ainda mais de alguém que possui
tanta importância quanto um rei), pois estupra a moça e a abandona logo em
seguida, sem se preocupar com o que lhe havia passado: Voltou ao seu reino, onde por um
longo tempo não se recordou mais daquele assunto.
Tália dá a luz , então, a duas
crianças: Sol e Lua, que devido ao estado adormecido de Tália, são
amparadas por duas fadas. Um dia, na ausência destas, os bebês com fome, por
extinto buscam o mamilo materno, e durante a procura, acabam por chupar o dedo
da mãe que havia sido espetado pela farpa e, assim, retiram-na da mulher, que
desperta de seu sono encantado. Aqui, vale ressaltar que as fadas auxiliam as
crianças, e nunca Tália.
Certo dia, o rei, lembrou-se
daquela bela jovem adormecida e de sua prazerosa aventura, e diante da ocasião
de uma caçada pelos arredores daquele castelo (novamente a sorte na narrativa),
resolve vê-la. No conto de Basile, é explicitado que o fato ocorrido entre o
rei e Tália foi uma aventura, com essa afirmação constante, se contraria
novamente os padrões cristãos para a época e até mesmo para os da
contemporaneidade, onde aventuras extra conjugais são abertamente condenadas.
Quando o rei adentra o quarto
onde está Tália, é novamente abarrotado por dois
prodígios de beleza, só que nesse momento a beleza a qual se refere é a de
seus dois filhos. O rei então conta o que houve a jovem, que de nada se
lembrava, e os dois incrivelmente ficam amigos, algo que não é comum, pois a
jovem fora estuprada pelo rei, gerara dois filhos enquanto estava
adormecida, e depois de toda essa situação aceita a amizade do homem que lhe colheu os frutos do amor e
que lhe promete buscá-la e levá-la ao seu reino.
Até este momento, a narrativa
se desenvolve em torno de Tália, mesmo que esta seja uma personagem totalmente
passiva nos acontecimentos. Mas, na sequência do conto, a Rainha entrará na
história e ganhará destaque durante sua busca por vingança.
A Rainha é retratada através de
figuras de linguagem e de algumas referências mitológicas como “coração de
Medéia”, “carranca de Nero”, “turca renegada”. De modo geral, o conto traz
figuras e símbolos para o interior de sua narrativa.
A esposa do rei, desconfiada
das frequentes caçadas do rei, questiona ao secretário em interesse de
descobrir por quem seu esposo está enamorado. O questionamento, único discurso
direto do texto, o que ressalta a importância desta personagem, é feito a
partir de duas possibilidades, entre as quais o secretário deverá
escolher: Se você me disser de
quem meu marido está enamorado, eu o farei rico; e, se me esconder a verdade,
farei com que nunca mais o encontrem, nem morto, nem vivo. A escolha é
a da riqueza. Aqui, novamente se há reversão dos costumes: a corrupção pelo
dinheiro, que transforma qualquer empregado fiel em aliado do inimigo.
A maldade da rainha,
entretanto, não cessara. Manda o secretário buscar Tália porque o rei desejava
vê-la. Entretanto, lá chegando, a moça é mandada para a fogueira, após claro,
uma série de insultos proferidos pela Rainha. Antes, a protagonista do conto
pede à esposa do rei, que possa retirar suas vestes; a rainha o aceita não por
bondade, mas por interesse na riqueza do tecido (vemos, portanto, mais um
elemento de interesse material presente no conto). No decorrer da ação, Tália
grita, o rei a escuta e manda a rainha e o secretário, que ajudara na maldade,
para a fogueira no lugar da bela adormecida. Recompensa o cozinheiro que havia
salvado os filhos, toma a Tália como esposa e vive feliz com ela e os filhos,
Sol e Lua.
Nesta segunda parte do conto,
temos a presença da “bruxa má”, figura carimbada de qualquer conto de fada,
pois a bondade exige de contrapartida a maldade. Porém, neste conto de Basile,
temos a Rainha que tem seu excesso de crueldade ao mandar matar Sol, Lua e
Tália. Mas por que a Rainha deseja essas mortes? Sua maldade é gratuita?
Podemos intitular de fato de maldade?
A nossa Rainha, descobre que
seu marido, o tão respeitado Rei, que sai para caçar e assim ter um pouco de
distração, estava se distraindo não só com os cervos. A Rainha descobre que o
Rei tem uma amante. Não só isso, mas que essa amante era uma linda jovem, que
foi abusada pelo rei em seu sono profundo durante uma aventura, aventura que
rendeu dois belos filhos, filhos estes que a Rainha não tinha. E ainda por
cima, o Rei promete trazer a amante para viver no reino.
Aqui, se revela o lado perverso
de qualquer ser humano ao se sentir ameaçado, humilhado, traído. Não que seja
justificável matar alguém, mas neste conto a maldade aparece como um fator
normal ao ser humano, pois ninguém é cem por cento mau ou cem por cento bom. A
maldade da Rainha foi motivada pelas atitudes inconsequentes do Rei, e assim
geraram um desejo por vingança,
um sentimento de amargura e tristeza.
Ao contrário da adaptação dos
irmãos Grimm, em que a “fada má” resolve castigar a princesa Aurora logo após
seu nascimento, unicamente pelo fato de não ter sido convidada para a
celebração de sua chegada. Um motivo fútil, em que a maldade está presente
apenas pela necessidade de estar, não há motivação alguma para que as ações más
ocorram.
Ainda observando a maldade e
comportamento, temos no fim o castigo final a aquele ser causador do mal: a
Rainha acaba por ser jogada na fogueira para ser queimada viva por sua
crueldade, enquanto isso, o Rei vive feliz com Tália e seus dois filhos.
Observamos então como os costumes da época eram controversos e como a mulher
era pouco decisiva nas decisões e ações. O Rei apronta durante todo o conto,
fere o que é posto como moral e bons costumes ao trair sua esposa, estuprar uma
jovem desacordada, depois abandoná-la, voltar meses depois para continuar sua
aventura e ainda jogar na fogueira sua esposa, que vale ressaltar, não tinha
consolidado ainda seu plano de vingança, mas que também não teve ao menos a
oportunidade de falar em sua defesa. E o “Felizes para sempre” é destinado ao
homem da história, que se formos observar seu percurso, é um homem “mau”, tanto
quanto a Rainha.
E para finalizar, vemos que a
versão de Basile é marcada pela presença do destino, desde o começo com a
referência aos sábios e adivinhos sobre o futuro de Tália; pelo acaso o rei
fora pela primeira vez ao palácio de Tália, depois de alguns meses, ainda por
acaso, por ocasião de uma caçada nas redondezas volta para vê-la; e esse
aspecto de sorte, ainda é reafirmado com a frase final do conto, que é uma
espécie de moral, que afirma esse encadeamento: aquele que tem sorte, o bem/mesmo
dormindo, obtém.
Concluindo, o conto apresenta
elementos que o distanciam dos contos de fadas amplamente divulgados: há uma
crueldade muito acentuada, cena de estupro, abandono e antropofagismo.
Malévola
No filme Malévola (2014), adaptação do conto A
Bela Adormecida, dos irmãos Grimm, feita pelas produções da
Disney, a narração da princesa Aurora diz: Vou contar uma velha história de um jeito novo, veremos o
quanto você a conhece. Nesta versão
cinematográfica, a figura da Malévola é ambivalente, pois foge do maniqueísmo
literário; ela não é nem boa nem má. O Rei, no filme, representa a figura
estereotipada do mal, pois ele é vaidoso e ganancioso, já a figura estereotipada
do bem é representada pelas três fadas, pois são elas que protegem e desejam o
bem a todos.
Malévola é de natureza
boa, pois é uma fada simpática, protetora de todos os habitantes do reino em
que vive. Há contraposição de dois reinos, o dos Moors, em que vivem seres
maravilhosos e o reino dos humanos, governado pelo ambicioso rei. A luta é dos
humanos contra as fadas. Stefan aparece no reino das fadas, em que conhece Malévola. Eles se apaixonam, mas Stefan é um ser humano sedento por poder e
dinheiro.
O rei dos humanos
ambiciona destruir o reino das criaturas mágicas, inclusive Malévola, para
usufruir das riquezas deste. Ele, às vésperas da morte, diz que deseja
conquistar o reino mágico; Stefan, ambicioso, deseja suceder-se ao trono do
rei, o qual prometeu doar todo o seu reinado a quem conseguisse vingá-lo, ou
seja, destruir os poderes da Malévola, a qual o feriu durante batalha entre os
dois reinos.
A reviravolta da
protagonista ocorre quando Stefan, em nova aproximação, corta as asas da fada.
Malévola não consegue mais voar, mas ainda tem alguns poderes mágicos. Ela
sente-se muito triste após esse fato, pois não poderia mais defender seu reino
das pretensões externas.
Stefan torna-se o rei
no reino dos seres humanos. Stefan e sua mulher dão à luz uma menina, chamada Aurora. Malévola
comparece à festa de celebração do nascimento de Aurora. Neste ponto, a versão
do filme mais se aproxima do conto A Bela
Adormecida, pois é quando Malévola surge para amaldiçoar a filha do homem
que a traiu. Malévola, então, deseja que Aurora, caso espete seu dedo em uma
roca, caia em sono profundo, podendo acordar somente com um beijo de amor
verdadeiro. Depois disso, o rei Stefan decide que Aurora, até seus 16 anos
(período de duração da maldição), fosse criada na floresta dos Moors com as
três fadas para que ela pudesse ficar salva de encontrar uma roca e ter a
curiosidade de espetar seu dedo nela.
Aurora cresce na
floresta, sempre sendo observada por Malévola, a qual a livra de muitos
perigos. A menina é curiosa e deseja conhecer
o mundo que havia além dela, mas Malévola a adverte que há um mal neste mundo e não pode protegê-la. Malévola, acaba por fim, arrependida e retira a maldição proferida
contra Aurora, mas é tarde.
Quando Aurora descobre
que tem um pai vivo e que, na verdade, não é órfã, sai pela floresta em busca
da verdade narrada pelas fadas que a criaram. Às vésperas de completar 16 anos,
poderá retornar ao palácio, pois o feitiço estará desfeito. Aurora, na sua
saída em busca de si, encontra Malévola e diz que uma fada má rogou-lhe
uma praga. Malévola confessa que foi ela esta fada, Aurora diz à Malévola: Você é o mal que existe no mundo.
Malévola sente-se
arrependida ao ver Aurora dormindo na cama do palácio após ter espetado seu
dedo em uma das rocas escondidas no porão do castelo. A fada confessa que foi
embebida de ódio e vingança. Malévola, protagonista da adaptação, é uma
personagem complexa que incorpora o bem e o mal em si. Ao final, o amor materno
que a fada nutre por Aurora a faz despertar do sono profundo. Malévola possui
características de uma mulher determinada, inconstante, verdadeira e guerreira,
não é uma mulher idealizada e passiva.
Malévola luta com o rei
Stefan nos minutos finais do filme. Ele a questiona como ela se sentia sendo
uma fada sem asas em um mundo que não era o dela. Ela, então, ganha novas asas
para guerrear no mundo ao qual não pertencia e em que nunca desejou pertencer.
O final feliz do filme
ocorre com a unificação dos dois reinos após a morte do rei Stefan. Aurora é
coroada rainha do reino humano e Malévola, como a princípio, é a rainha do
reino dos Moors.
A narradora, Aurora,
presente no início ao fim do filme para contar a história diz que: A história não é bem como contaram a você, e
diz, ainda, que sabe bem disto, pois ela
própria foi chamada de Bela Adormecida. Aurora termina por dizer que No final, o reino foi unificado não por um
herói ou um vilão, como previra a lei, mas por alguém que era tanto herói
quanto vilão. E seu nome era Malévola.
Uma questão de perspectiva
Apesar de se servirem
de um mesmo núcleo narrativo as três histórias sobre a bela adormecida que
citamos trabalham de maneira diferente com os elementos que constituem aquele
núcleo. Utilizaremos, como fio condutor de nossa análise, a maldade.
Em Sol, Lua e Tália a figura da Rainha representa o polo antagônico da
narrativa. Como já discutimos anteriormente, ao nosso ver, existe uma motivação
para as reações desta personagem, porém, para os fins de nossa analise atual,
consideraremos que a narrativa não os apresenta, explicitamente. Não
há tentativa de apresentar o Rei como culpável e da Rainha como alguém que
sofreu um agravo, isso porque, como também comentamos, o homem é a figura
central, tudo lhe é permitido e perdoado. É interessante pensar, para encerrar
esse ponto e focarmos na questão da maldade, que a mocinha perdoa a atitude do
Rei, já a Rainha não e, além disso, procura se vingar.
A Rainha, apesar das
considerações anteriores, é construída na narrativa como a antagonista. Sua
primeira aparição nos revela, por exemplo, que ela é irascível, porque foi
tomada de um ardor maior do que de costume. Também usa de
chantagem para que o secretário do Rei lhe dê as informações que quer. E como
ponto alto de sua maldade, manda matar e cozinhar os filhos de seu marido. A
crueldade do seu ato é incontestável. É importante perceber também que a
vingança, cultivada por ela, é contra o rei, mas tem como alvos outros personagens
que foram ainda mais vítimas do que ela. Também não há arrependimento. Em
momento algum ela demonstra compaixão ou compreensão pela situação de Tália e
seus filhos. Assim, a maldade apresentada nessa personagem é arquetípica. A
sombra que é lançada sobre ela desde sua primeira aparição não é atenuada, ao
contrário, é acentuada em cada ação.
Na versão mais
difundida da história, a dos Irmãos Grimm, os atos da fada má, embora baseados em pretextos fúteis
como foi assinalado, se limitam à tentativa de matar a Bela Adormecida. Não é
de modo nenhum menos terrível, mas é evidentemente menos cruel que matar e
cozinhar os filhos, e jogar na fogueira a mãe. Em comum com a personagem de Sol, Lua e Tália, ela também procura se
vingar do agravo feito pela corte e também não apresenta nenhum arrependimento.
As duas personagens representam, portanto, uma mesma concepção do mal em graus
diferentes.
Já, na história fílmica
que escolhemos há uma grande mudança. De semelhança vemos que ela é afrontada pelo
jovem que se tornará rei e se move pelo desejo de vingança. Também como nas
outras histórias, ela procura se vingar do rei atingindo sua filha inocente,
porém aqui acabam as semelhanças. Como já dissemos anteriormente, ela é, em sua
infância e juventude, uma fada boa e protetora. Esse simples passado de bondade
se contrasta com o ardor maior do que de
costume da rainha e da denominação de fada
má que coloca a personagem de A Bela Adormecida como alguém sem nenhuma
outra característica.
Além disso, durante o
crescimento de Aurora, é Malévola quem cuida e protege a menina e que por fim
cria um vínculo com ela. Ela se torna a fada madrinha da jovem contrariando
toda a tradição dessa história. A figura que seria a representação mais crua do
mal volta, nessa interação com a menina, ao seu estado primeiro de bondade e
empatia.
Já estamos em outro
terreno bem diferente da maldade absoluta vista nas duas primeiras personagens
e isso é atestado no arrependimento de Malévola. Além de cuidar da criança e se
tornar uma fada madrinha para ela, Malévola se arrepende, como citamos no
tópico anterior, e tenta salvar a moça. Ela ainda se ressente e não confia no
rei, mas percebe que Aurora não merece ser punida pela maldade do pai.
As considerações feitas
acima nos fazem perceber que, se as duas primeiras personagens são protótipos
de maldade e crueldade, Malévola é mais humana e real. Ela não é boa ou má, ela
simplesmente reage aos acontecimentos e é transformada por eles. Ao ser traída,
se torna dura e cruel, mas quando se depara com a inocência e bondade de
Aurora, ela volta ter empatia e sensibilidade.
Considerações finais
Podemos ver, através
desses textos, a mudança que os contos de fadas sofrem ao serem contados e
recontados. Cada versão atraindo para si as ideologias de sua época e das
pessoas que as contaram.
Uma mantém o caráter
cruel da sociedade que a gerou apresentando explicitamente assuntos que, se
para nós são horrendos, para aquele momento eram comuns e aceitos como comum.
Também deixa o homem em sua posição de domínio e superioridade.
Outra idealiza a mulher
e propõem para as jovens que serão atingidas por aquela historia um padrão de
comportamento passivo e submisso que norteia a ideologia daquela sociedade. O
homem continua sendo superior, pois é só o seu beijo que pode salvar a linda donzela.
A última, no entanto,
aponta para uma sociedade em mudança que começa a perceber os estereótipos que
criou e os malefícios deles, que repensa o amor verdadeiro prototípico de
contos de fadas reformulando-o em um profundo amor maternal. E que, além disso,
demonstra não haver linhas precisas entre o bem e o mal, não sendo esses
opostos, mas partes de um mesmo ser.
Referências bibliográficas
DARTON, Robert. Histórias que os
camponeses contam: o significado de Mamãe Ganso. In: O grande massacre de
gatos: e outros episódios da história cultual francesa. Tradução: Sonia
Coutinho. Rio de Janeiro: Graal, 1986.
GIAMBATISTA, Basile. Sol, Lua e Tália.
Disponível em: <http://volobuef.tripod.com/op_basile_sol_lua_talia...> Acesso em: 11 jun. 2015.
GRIMM, Jacob & Wilhelm. Contos
Maravilhosos Infantis e Domésticos - Translation by Christine Röhrig. São
Paulo: Cosac Naify, 2012.
MALÉVOLA. Direção: Robert Stromberg. Estados Unidos, Reino Unido: Walt Disney Studios, 2014. 105 min.
Grupo:
Aline Aparecido da Silva (7610984)
Júlia M. F. Espirito Santo (7616191)
Rafaela Barbosa Américo (7615440)
Suellen Regina Alves da Silva (7615502)
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